quinta-feira, 21 de abril de 2016

AS AVENTURAS DE FAILA



A menina o jacaré e o lobo

PRIMEIRA PARTE    21/04/2016

            Faila era uma menina muito corajosa. Tinha os cabelos pretos e a pele morena. Com apenas 10 anos ela já era uma exímia pescadora. Todos os dias ao chegar da escola, dizia à sua mãe: “mamãe, vou fazer a tarefa de casa e depois vou pescar”
Então, num desses dias a Faila chegou, almoçou, fez a lição de casa, pegou a varinha de pescar, foi no fundo do quintal e apanhou umas minhocas, colocando-as em um embornal: “mamãe, já estou indo”.
            - “tá bom, filha, mas tome muito cuidado, não vá muito longe, e, qualquer coisa, me chame”.
            - “tá, mãe”. E foi.
            No lugar que Faila habitualmente pescava era um riacho muito tranquilo, ficava cerca de 100 metros de sua casa e se gritasse para a mãe, a mãe viria correndo, mas…
            Rio acima, lá perto da montanha, era bem perigoso. Havia um jacaré muito  bravo que devorava, comia, todo ser vivo que lá aparecia. Esse jacaré era enorme e a casca das suas costas, rabo e cabeça era muito dura. Quando ele, com aquela boca enorme, atacava um lobo, o lobo se defendia dando mordidas na cabeça e nas costas do jacaré. Mas, não adiantava, o lobo acabava sendo devorado pelo réptil.
            Ao chegar no riacho tranquilo, a Faila sentou-se na margem e começou a preparar a varinha de pescar, colocando a isca no anzol e... quando ia jogar a linha para o rio ouviu o que pareceu um uivo de lobo, que mais parecia um choro. Parou, esticou o pescoço para o lado que vinha o som na intenção de perceber melhor do que se tratava.
- ÁÁÁUUUUUUU!
- É um lobo - disse ela – mas parece que chora. Será?!
Faila, deixou a varinha de pescar de lado e resolveu ir ver quem era aquele lobo sofredor, e porque sofria. O uivo vinha lá do lado de cima do rio, pro lado da montanha. Ela sabia que era perigoso, mas corajosa que era e como tinha muito carinho com animais, resolveu investigar. E foi. Passou por quedas d'água, nas quais via os peixes subindo o rio em direção à nascente; era época de piracema.
(Piracema é o período de reprodução dos peixes. Durante esse período, eles se deslocam até as nascentes dos rios ou até regiões rasas dos mesmos com ervas, para desovar).
 Parecia que o uivo estava mais perto, agora. - ÁÁÁUUUUUUU! A impressão que Faila tinha era de que o choro do bicho vinha de dentro da floresta, bem perto da montanha. Resolveu entrar na floresta. Dentro da mata, enquanto caminhava em direção ao uivo, se deparou, várias vezes com animais que habitam ali. Mico-Leão-dourado, Araçari-banana; viu de longe uma Onça-pintada, um quati e uma cobra grande enrolada numa árvore. Ficou com medo, mas prosseguiu, assim mesmo. Agora parece que estava muito perto do uivo. - ÁÁÁUUUUUUU! - Sentiu um frio de medo percorrer seu corpo. Após andar mais uns minutos, ouviu o uivo e ficou gelada com o que viu logo a sua frente.
            Um buraco grande, no meio da clareira, com mais ou menos 3 metros de fundura e dois de largura; no fundo havia um lobo grande, porém, emagrecido, talvez de fome e sede. Ela pensou: “esse buraco está me parecendo buraco de caçador”. Os caçadores clandestinos fazem buracos na floresta para que os bichos caiam, e aí, depois de um tempo, o caçador vem e aprisiona o animal, para vender na cidade.
            Faila pegou uma faquinha que tinha pendurada na cintura, cortou um cipó que parecia uma corda, amarrou o cipó num toco de árvore, esticou-o e jogou no buraco. A intenção da menina era amarrar o lobo na corda, ops, no cipó e depois içá-lo para cima, e levá-lo para casa, adotar ele. Devagar foi descendo pelo cipó em direção ao lobo; quando estava quase chegando ao fundo, o lobo, mesmo fraco, encontrou forças para rosnar e arreganhar os dentes em direção à Faila. A menina parou com medo, devagarinho foi voltando para cima. Quando chegou à superfície olhou para o lobo e disse: Não vou te deixar aí sofrendo desse jeito, vou buscar comida e água para você...

SEGUNDA PARTE


Decidida a salvar a vida daquele lobo Faila iniciou a caminhada de volta, passou novamente pelos mesmos lugares. Viu os macacos, a onça, o quati, a cobra; sentia o mesmo medo de antes, mas, decidida seguiu em direção à sua casa. Terminando de atravessar a floresta, chegando ao riozinho, pegou sua vara de pesca, o embornal com as minhocas já secas e seguiu. Ao chegar em casa disse: “oi mãe”. “Oi Faila, pegou muito peixe hoje?”... “Que nada mãe, parece que os peixes sumiram todos, não pesquei nenhum”. A mãe de Faila estranhou, pois nunca havia acontecido nada parecido, sempre a filha vinha com o embornal cheio. “Tudo bem, filha, vá tomar um banho, depois coma algo. Deitar cedo hoje, pois amanhã antes de sair para a escola, vai estudar mais um pouquinho para a prova de Matemática”
Faila pensou um pouco e disse: “mãe, lá perto do rio tem um cachorrinho magrinho, com fome e sede, preciso levar água e comida para ele. Posso? “Só se não demorar muito, daqui a pouco vai escurecer, vou colocar água e umas coisinhas e você leva para ele comer”. A mãe da menina arrumou tudo, colocou no embornal e disse: Vá e volte bem depressa, depois banho e dormir”. “Tá mãe, to indo".
Correndo, como nunca correu antes, Faila chegou na clareira bem depressa, parece que nem prestou atenção nos bichos da floresta, tal era sua pressa em ajudar o seu novo amigo faminto. Embornal pendurado no pescoço, começou a descer pelo cipó. Ao chegar ao fundo, novamente o lobo rosnou para ela, embora sem forças para levantar, ou lutar. Devagarinho Faila se aproximou do rabo do lobo e um pouco trêmula acariciou-o. O lobo levantou devagar a cabeça, abriu bem os olhos e tentou rosnar, mas estava muito fraco e deitou a cabeça de novo. A menina continuou a fazer carinho, agora subindo com a mão pelas costas do animal, que, parecia morto. De carinho em carinho chegou com a mão na cabeça do lobo, que abriu os olhos como que agradecendo aquela carícia.
Faila pegou um pouco de água e pingou na cara do animal que, ao sentir o frescor escorrendo perto do focinho, lambeu aquelas gotas salvadoras. Abriu os olhos agradecido e abriu a boca esperando mais um pouco do líquido refrescante. A amiguinha percebeu que estava conquistando o lobo e foi despejando, pouco a pouco a água na boca do bicho. Depois de saciar a sede, ele começou a receber alimento. Depois de matar a sede e a fome do lobo, Faila fez mais um carinho no amigo e foi-se, decidida a voltar durante os dias seguintes. Todos os dias, até que ele tenha se recuperado por inteiro.
CONTINUAÇÃO - 22/04/2016 - sexta-feira


Nos dias seguintes, Faila resolveu utilizar uma tática a fim de que a mãe não desconfiasse da aventura que ela estava vivendo. Ao chegar da escola, depois de comer e fazer a lição de casa, pegava, como sempre a varinha de pesca, as minhocas e água e comida para o ‘cachorrinho’. “Mãe, estou indo pescar e levando alimento para o ‘cachorrinho magrinho’. Ia para o rio e pescava uns poucos peixes, colocava no embornal e seguia em direção à floresta.

Chegando na clareira, Faila descia pelo cipó e alimentava seu amigo lobo. Com o passar dos dias, a menina foi ganhando a confiança do animal; quando ela chegava, o amigo já estava esperando-a, abanava o rabo e lhe dava lambidas, como demonstração de amizade e agradecimento. Conversando com o bicho ela dizia coisas como: “Meu amigo, você está melhorando rapidamente, já engordou um pouco e consegue ficar em pé. Que maravilha!!!”.
Naqueles dias, ao voltar do seu encontro com o lobo, a mãe estranhava a pouca quantidade de peixes que a filha estava trazendo: “Faila, você sempre trouxe o embornal cheio, e agora, só isso. Por que? “Sabe, mãe, acho que é o calor, acho que muitos peixes estão deixando para sair da loca (buraco onde os peixes moram) durante a noite, que é mais fresquinho”. A mãe de Faila dava de ombros, concordando, meio a contra-gosto. 
Depois de muitos dias alimentando e hidratando seu amigo lobo a menina percebeu que ele já estava impaciente para sair daquele buraco. Pelas marcas de unha na parede do buraco dava pra ver que o lobo já dava saltos bem altos, tentando escapar; só não conseguia sair porque o buraco era muito fundo. Era chegado o momento de libertar seu amigo. Foi na floresta e cortou outro cipó, amarrando-o no peito do amigo, perto das patas dianteiras. A todo instante ele a lambia atrapalhando-a no ato de amarrar. “Acalme-se amiguinho, estou tentando amarrá-lo para tirá-lo daqui!”.
Depois de uma ponta do cipó estar bem amarrada no corpo do lobo, Faila pegou a outra ponta amarrou em sua cintura e subiu pelo outro cipó. Chegando lá em cima, começou a puchar, dizendo a todo momento: “Pula, amigo, pula”. O lobo pulava e ela puchava, mas era muito alto. Já cansada, ela sentou-se e pensou um pouco: “Já sei, vou buscar a emxada de cavucar minhocas e farei uma rampa. Como um vento, ela foi e voltou. Com a enxada fez uma rampa, por onde, com sua ajuda o lobo conseguiu subir. Desamarrou o amigo e disse: “Pode ir, amiguinho, você está livre”. Fez uns carinhos na cabeça e nas costas do lobo e recebeu muitas lambidas. Daí, ele baixou a cabeça e foi saindo devagar, depois levantou a cabeça e começou a correr.
A menina ficou olhando o lobo atravessar a floresta correndo e subindo a montanha. Lá do alto da montanha o seu amigo levantou bem a cabeça e deu o uivo mais bonito que a Faila já tinha ouvido em toda sua vida. AAAUUUUUUU!!!
CONTINUA... na próxima semana


FINAL

O tempo passou e Faila continuou sua vidinha tranquila. Como sempre ao voltar da escola, almoçava, fazia a lição de casa e dizia à mãe: “Mãe, tô indo pescar.” – “tá bom, filha, volte logo. Ah! Coloque as botas de couro, para se proteger, me disseram que ultimamente tem aparecido cobras vindas da mata”.
“Tá, Mãe, vou colocar”. Faila vestiu as botas de couro, que cobriam as suas pernas até o joelho. E foi em direção ao riacho.
 

Embornal com minhocas e vara de pescar na mão, a menina seguia para o riozinho. Ela adorava pescar, e, todos os dias depois da pescaria ia para casa com o embornal cheio... Mas, com o passar do tempo foi sentindo que lhe faltava alguma coisa. Um dia, na margem do rio, com o embornal já pela metade, ela pensou: “Ai! que saudade do meu amigo lobo, acho que vou andar pela floresta para ver se o encontro”. Encostou a varinha de pesca num morrinho de cupim, pendurou o embornal, com peixes até o meio, no ombro e foi para a mata a procura do seu amigo lobo.
Enquanto andava entre as árvores Faila ia pensando que deveria dar um nome ao seu amigo. Lembrou-se de um livro vermelho, que seu pai lê, de vez em quando. É o livro de um filósofo alemão, que viveu no Século XIX cujo nome é Karl (Cal). “Bonito nome, pensou a menina; se encontrá-lo vou chamá-lo Cal”.
Estava cansada de tanto procurar e já quase desistindo, para voltar outro dia, quando ouviu um uivo: ÁÁÁÁUUUUU. “É ele, é o Cal”, e saiu correndo em direção ao uivo. Chegando perto da montanha viu, lá em cima o seu amigo olhando para o alto e uivando: ÁÁÁÁUUUUU.
Emocionada gritou: “Amigo, venha aqui; Cal, venha, venha”. O lobo ao ouvir a voz da Faila, olhou para baixo e, ao vê-la, começou a descer a montanha, correndo. Ao chegar, correndo, o amiguinho trombou com a menina, que caiu dizendo: “nooossa, você gosta tanto de mim, assim, a ponto de me derrubar”. Cal, o lobo, fazia tanta festa, lambia a mão da Faila, o rosto, os cabelos. Ela o abraçava e dizia: “Cal, eu estava com muitas saudades de você, vamos dar uma volta pela floresta; quero conhecer a montanha, vamos”. Começou a puchar o amigo em direção à montanha; quando ia passando perto do Rio, o Jacaré pulou em cima dos dois, deu uma rabada com força no Cal, jogando-o longe, em seguida abocanhou a perna de Faila e foi puchando-a para o rio, onde pretendia devorá-la. Faila puchou a faca da cintura e deu um golpe bem no olho esquerdo do malvado; ele continuou a puchá-la apesar da dor que estava sentindo. Cego de um olho e sentindo muita dor o jacaré continuou a arrastá-la em direção ao rio. Nisso, o lobo, recuperado da rabada do jacaré, veio correndo para defender a amiga; pulou e deu uma forte mordida no olho direito do réptil, arrancando-o. Agora, o jacaré, cego dos dois olhos e não aguentando tanta dor, soltou a perna da Faila e pulou no rio.
Cal, o lobo, com a boca, pegou na roupa da menina e foi arrastando-a até chegar à sombra de uma árvore. Faila, ainda tonta pela luta, começou a retirar a bota da perna que o jacaré havia pegado. Na bota ficaram as marcas dos dentes do animal. “Como vou explicar pra mãe essas marcas”? Ao terminar de tirar a bota, percebeu que não estava muito machucada, graças às botas. O Cal, percebendo os ferimentos, começou tratar com lambidas, aqueles machucados. Faila disse: Amigo, se não fosse você, agora eu estaria dentro da barriga do jacaré. Obrigado, amigão”! O lobo continuou a lamber os ferimentos, até que Faila, já recuperada, resolveu ir embora. Mas, depois dessa louca aventura, a vida nunca mais seria a mesma. Resolveu que, voltaria a ver o Cal, com mais frequência.
Faila estava feliz da vida, pois ela e o Cal venceram um inimigo mortal, o jacaré, que estava acostumado a devorar qualquer animal ou pessoa que se aproximava do seu reduto. Mas estava triste porque era o momento de se despedir o seu amigo lobo. “Tchau, meu querido, vou mas em breve voltarei para novos passeios”. O Cal abanou o rabo e deu umas lambidas na mão de Faila, em seguida saiu correndo em direção da sua montanha, e, lá do alto uivou, despedindo-se da amiga: ÁÁÁÁUUUUU.

O feroz jacaré, cego dos dois olhos, desse dia em diante, nunca mais saiu do rio para morder ninguém. A partir de então só come peixes; fica com a boca aberta e quando passa um peixe nadando na sua boca, ele fecha a boca e o engole.

  
Fim
 


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