Ele era marrom, com lindas manchas brancas. Logo que o vi
gostei dele e ele de mim. Chamei-o de Malhado, ele atendeu prontamente, se
aproximou de mim. Parecia que a gente se conhecia há muito tempo, éramos velhos
amigos. Malhado era muito mais do que um bom cavalo, era um ótimo companheiro. Quando
saíamos juntos a passear, tudo ficava mais bonito. A vida parecia encantada, o
mundo se aproximava do ideal.
Em uma de nossas aventuras conhecemos o país ideal. Foi assim
que tudo começou:
Malhado e eu estávamos a galopar por uma planície, sentíamos
a brisa fresca a nos acariciar a pele. Neste galope passávamos por canteiros de
flores do campo, de todos os tipos e cores: Margaridas, magnólias , rosas... O
perfume delas nos deixava inebriados. De repente fomos nos aproximando de uma
névoa, uma nuvem que nos envolveu completamente. Malhado, cautelosamente foi
diminuindo a velocidade, de galope passou a trotar, depois caminhar, até que a
névoa desapareceu e chegamos a um lugar diferente. Era uma cidade muito bonita,
toda colorida. As ruas eram ladeadas por arvores frutíferas e flores. As edificações
eram coloridas com cores suaves: azul-claro, rosa-claro, verde-claro,
amarelo-claro, alaranjado, etc. Uma melodia deliciosa e um perfume suave, quase
imperceptível enchiam o ar. No rosto das pessoas percebia-se uma expressão de
contentamento, alegria. O curioso é que não
víamos automóveis ou motocicletas neste lugar. Os únicos veículos que
passavam lentamente a intervalos regulares eram uma espécie de ônibus que não
produzia ruído nem fumaça. Ele dava-nos a impressão de estar deslizando num
colchão de ar, agradavelmente, sem pressa.
Chegamos a uma praça que tinha um quiosque de informações,
paramos para inquirir. Malhado se dirigiu para um regato de águas límpidas situado
bem no centro da praça. Enquanto bebia água e depois degustava a grama
verdinha, apetitosa, Malhado aproveitava para apreciar as crianças que
brincavam no parquinho (playground) existente no local.
– Sejam bem vindos –
disse a linda moça negra, com voz melodiosa. Ela transmitia serenidade, seus
olhos e sua boca sorriam enquanto falava. – posso ser útil, precisam de alguma
informação?
– Sim, chegamos aqui,
eu e o Malhado, por acaso. Gostaríamos de saber que lugar é esse.
– Na verdade – ela disse
– vocês não vieram para cá por acaso. Tudo tem um propósito. Este lugar, como
vocês estão vendo é muito tranquilo, mas não foi sempre assim. Aqui tinha
violência, corrupção, roubos, injustiça social, desemprego, pobreza, poluição,
doenças, preconceitos. Enfim, faltava respeito ao ser humano e à Natureza. Até
que um dia chegou um grupo de saltimbancos. Aqueles malabaristas foram
conquistando aos poucos pequenas porções da população, depois a maioria da
população. Aquelas pessoas que antes só viam televisão, agora começavam sair
para as ruas para ver as acrobacias dos saltimbancos. Depois de certo tempo,
eles começaram a mostrar espetáculos teatrais. Isso tudo foi despertando o
cérebro adormecido do povo para as coisas da realidade. Após o teatro, eles
começaram a trazer livros e assim nossa população foi evoluindo e tomando
consciência de que as coisas poderiam ser diferentes. Que dependia de nós
continuar naquela tristeza, convivendo com a violência, corrupção,... Ou dar um
salto de qualidade transformando o país em um lugar melhor para se viver.
As pessoas começaram a conversar mais, ter uma convivência
em comunidade. Vizinhos que mal se viam de vez em quando, agora passavam horas
trocando experiências enriquecedoras. O crescimento intelectual das pessoas foi
tanto que o país começou a se transformar. A primeira medida tomada foi uma lei
de iniciativa popular que rezava o seguinte:
Parágrafo 1: Todas as ruas e praças deste país deverão ser
arborizadas com árvores frutíferas em toda sua extensão, para que não faltem
frutas na alimentação do nosso povo, melhorando assim a saúde da população. E assim,
a população foi criando leis como: garantia de emprego para todas as pessoas,
direito à moradia digna para todos, direito à saúde de boa qualidade. Direito
ao ensino gratuito da pré-escola até a faculdade, para todos, independente de
classe social. E outras.
Aliás, esse negócio de classe social, aqui já não existe
mais, nós abolimos todas as diferenças.
Nesse momento eu interrompi a moça e perguntei:
– Mas como é isso? Eu
acho legal diminuir as diferenças, mas não consigo entender por exemplo um
lixeiro ganhando o mesmo salário de um médico.
Ela explicou:
– Aí é que está, em
nosso sistema todas as pessoas têm o mesmo nível intelectual, tanto o médico
como o gari, como o servente, ou qualquer outro profissional. Aliás, o gari que
recolhe o lixo da minha rua é formado em Filosofia e Sociologia, o servente do
prédio onde moro é formado em Astronomia e está sendo cotado para ser um dos
tripulantes da próxima viagem interplanetária com destino à Saturno, o
ascensorista já escreveu vários livros
de fama internacional.
Nesse momento eu a interrompi novamente:
– Puxa vida, minha
cabeça está girando, estou tonto com tudo isso que você está me contando. E você, o que faz além de atender o público
neste quiosque de informações?
– Eu, bom, este ano
estou como Presidente da República e dou plantão neste quiosque uma vez por
semana.
Nisso, o Malhado se aproximou e parou perto de nós. A presidenta
fez um carinho no Malhado e se despediu de nós dizendo:
– Tudo que existe
está relacionado. O bem individual é impossível sem o bem coletivo. Só depois
que entendemos isso é que conseguimos acabar com a violência e com todos os
outros males que afligem o Mundo.
Montei o Malhado e fomos andando e andando. Atravessamos o
país de ponta a ponta, comprovando tudo o que ela dissera. Tudo que vimos
naquele país, além de nos encher de entusiasmo e esperança, aumentou muito a
nossa vontade de lutar por um Mundo melhor.
Novamente aquela névoa nos envolveu... Quando saímos dela
não havia nada além da planície. Galopamos um pouco. Aliás, ainda estamos
galopando a procura daquele lugar maravilhoso. O país ideal.
Continuaremos, eu e o Malhado, nessa busca do país ideal
enquanto a gente viver. 23.51h
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